quarta-feira, 6 de julho de 2011

Livro 2 - Capítulo 13

Segui pela Ruy Carneiro até a praia, dando uma parada no supermercado que tem na avenida. Imaginei que aquela região era bem melhor para morar, selecionei alguns lugares possíveis e comecei a me preparar para uma possível migração do centro para ali, isso se voltasse a ver minha casa.. Encontraria uma casa grande, com muros altos, e grande quintal onde esperaria por sobreviventes. Aos poucos poderíamos ir limpando o bairro, fortalecendo nosso pequeno grupo, ampliando nosso alcance, renascendo enquanto sociedade. Me dei o direito de sonhar enquanto caminhava olhando aquelas casas grandes que tem na Ruy Carneiro, com seus muros altos.

Foi quando vi a estação de luz da Energisa. Muros de blocos de concreto altos, fornecimento de energia elétrica garantido, proteções naturais em volta, como o pântano que tem atrás, portões de aço grandes e pesados, espaço territorial, uma base preparada para que pessoas durmam nela, segurança a toda prova. Ali era perfeito, e ainda poderíamos manter a rede elétrica funcionando, de alguma forma. Não seria difícil enxergar um recomeço que partisse dali. Segui o caminho me prometendo voltar àquela base mais tarde, para um estudo mais aprimorado e cuidadoso.

No caminho para o shopping ainda encontrei muitos zumbis, com os quais evitei contatos. Pensei que veria ainda mais, mas parecia que a cidade tinha sido evacuada com eficiência pelo governo. Eu havia lido em um site que as grandes capitais haviam sido as primeiras cidades a serem esvaziadas. No caso de João Pessoa, toda a população viva tinha sido direcionada para o Almeidão. Imaginei que ainda estivessem lá, e que não seria de todo ruim ir para o estádio para ter com quem conversar. Depois pensei em escassez de comida, insanidade coletiva, falta de armas, insegurança. Pensando bem, queria passar o mais longe possível do Almeidão.

O estacionamento do shopping me parecia bastante calmo. Campo aberto, espaço grande entre os carros, não havia muitos deles na área para tentar me pegar. Joguei a bolsa por cima da cerca de metal e pulei. A dificuldade em executar esta tarefa me fez pensar que eu precisava de mais exercícios, e mais prática em escaladas e coisas do tipo. Zumbis não escalam paredes, mas eu poderia escalar. Lembrei de todas as técnicas de sobrevivência que não aprendi e todas as que aprendi. Em meu período como capelão das forças armadas passei por um curso de sobrevivência na selva que foi bastante pesado e denso. Sobreviver não é uma opção, e sim a única escolha. Bons tempos servindo em Porto Príncipe, capital do Haiti, quando os zumbis eram apenas uma lenda que os vudus locais contavam para assustar o povo.

Na verdade não eram bons tempos. Era um país que sofria com uma guerra civil pesada, passando por uma situação complicada. Auxiliar os soldados a ter fé nos momentos mais difíceis era meu papel. Voltei e, depois de alguns anos, a situação no país conseguiu ficar pior, com o terremoto. Ouvi alguns "evangélicos" falando sobre a justiça divina recaindo sobre o país, que o vudu estava sendo vingado pelas "mãos poderosas do Senhor". Fico pensando no quanto conseguíamos ser egoístas com nossas opiniões e nossa forma de ver o mundo. Quer dizer que só porque as pessoas não acreditam no mesmo que eu elas não têm direito a sobreviver? Precisam ser engolidas por um terremoto, ter seus lares destruídos e seus parentes ceifados eternamente? Não vivemos no mundo do antigo testamento. Aliás, já não vivemos sequer no mundo do novo depois do apocalipse.

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