segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Livro 4 - Capítulo 10


Me afastei e comecei a gritar pelos zumbis no meio da rua junto com Patrícia. Atirávamos em alguns que estavam mais perto. Quando olhei direito, a manada estava imensa, com uns oitenta, cem desmortos. Corremos na direção da praia e viramos à esquerda, voltando para o Retão de Manaíra, ainda chamando a atenção dos desmortos. Só ficaria satisfeito quando eles saíssem da frente do prédio de Renata, deixando Marcos e Angélica em paz.

Os zumbis vieram atrás de nós por uma quadra até o retão, que estava coberto de carros. O grupo acabaria dispersando com aquelas barreiras todas e ficaria muito mais fácil combate-los. O problema é que todos os acessos ao prédio de Renata estavam lotados de desmortos. Eu precisava pensar em uma rota alternativa antes de voltar para o shopping, que eu via ao longe, uma grande caixa cinza perto da BR 230.

Entre os carros os zumbis começaram a ficar mais lentos do que nós. Alguns até desistiam da perseguição e uns viraram as costas simplesmente indo embora. Porém, eu e Patrícia ainda estávamos sendo cercados por eles. Seguimos por uma quadra, duas até que eles começaram a sair da rua que cruzava a altura que nós estávamos. Não havia para onde correr. Andávamos por cima dos carros, pulando de um para o outro, na esperança de conseguir nos livrar dos mortos, mas não conseguimos.

Ao longe, vi o shopping, a nossa única esperança de fuga. Quando olhei para trás, Patrícia se entretia em chutar o rosto de um dos zumbis enquanto atirava em outro que estava logo ao lado. À minha volta, cinco zumbis começavam a subir na carroceria de uma caminhonete para onde eu estava indo. Pulei no meio deles com o facão em mãos. Senti uma mordida atingindo o colete a prova de balas na altura do ombro enquanto cortava o alto do crânio de um zumbi e empurrava o outro com o pé. Dois estavam longe o bastante para me dar tempo de cuidar do mordedor, que recebeu uma facada rachando a cabeça ao meio.

Os outros dois zumbis chegaram perto. Um teve o rosto arrancado pela lâmina do facão enquanto o segundo recebeu um chute no estômago que o jogou de costas no chão. Cravei o facão entre seus olhos e segui. Perdi muito tempo naquela batalha tola, mas aprendi que precisava de sangue frio se quisesse sobreviver naquele mundo. Fui conferir a mordia que havia recebido no ombro. Não havia atravessado sequer a primeira camada de tecido do colete.

Corri sobre os carros com Patrícia logo atrás, até ser surpreendida por um zumbi que puxou seu pé e a derrubou na carroceria de um sedã.

A partir daí tudo parecia acontecer em um daqueles pesadelos onde estamos presos, tentando correr, mas não conseguimos. Vi seu corpo caindo em câmera lenta sobre o capô do carro e o rosto romper o para-brisa e ficar coberto de sangue. Ela tentou levantar atordoada, mas vi quando o zumbi que a havia derrubado subia por cima dela, estendendo suas mãos imundas sobre a pele branca da menina. Aquela coisa parecia procurar o local com carne mais saborosa e mordeu a parte posterior da coxa de Patrícia, arrancando um pedaço grande. Ela gritou alto, quebrando o silêncio daquele dia infernal. Eu não podia fazer mais nada. Patrícia estava condenada.

Mas ela não se deu por vencida. Virou-se para cortar a cabeça do desmorto enquanto seu sangue escorria da coxa. A mordida havia sido profunda, o músculo havia se rompido e a artéria femoral estava aberta, jorrando sangue. Seu tempo de vida se abreviava demais.

_ Vai embora, eu seguro eles o quanto puder. Vai! Tem gente precisando de você.

_ Não posso te deixar, Patrícia. Não posso te deixar aqui.

_ Pode sim. Saiba que eu não me entreguei. Eu lutei até o final para viver. Avisa eles que eu lutei, que não era nenhuma patricinha maluca que só gostava de consumir. Eu também tinha um coração e uma mente e você conseguiu enxergar isso.

Quando disse isso foi mordida por outro zumbi na barriga. Ela atirou na sua cabeça e em mais dois que vinham em sua direção. Tirou a mochila das costas com os restos de força que tinha e lançou para mim antes que uma mulher arrancasse um pedaço grande do seu braço. Seu rosto havia sido tomado pela dor e pelo sangue e seus gritos poderiam ser ouvidos a quilômetros de distância.

Chorei enquanto corria contra o fluxo de zumbis que se acotovelavam sobre o corpo de Patrícia, rasgando sua pele, arrancando sua carne, seus órgãos e membros, eviscerando a jovem. Olhei para trás apenas para ver o enxame de desmortos que disputavam os pedaços dela. Era quase uma da tarde, um sol a pino e a pessoa que aquele mundo mais havia transformado não vivia mais.

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